Assisti essa semana o documentário "Só dez por cento é mentira", do diretor Pedro Cezar, em um streaming. Manoel de Barros nasceu em Cuiabá, Mato Grosso, e viveu no Mato Grosso do Sul. Um poeta pantaneiro e cheio de inspiração universal. No filme vemos desde sua vida cotidiana, sua casa, depoimento de filhos, amigos e profissionais, e o poeta contando todo pimpão que sua esposa ainda tinha ciúmes dele. Manoel morreu em 2014, aos 97 anos. E o documentário é de 2010 ( foi lançado agora). Ele diz sorrindo: "sou muito assediado". Que amor.
"Assédio" cheio de motivo. Manoel de Barros é um poeta genial. Capaz de atingir com suas palavras, a quem leia. Claro que ler, gostar, entender, depende do percurso de cada um. Mas quero dizer que, você não precisa de gostar de poesia - aquele monte de estrofes, com versos -a poesia obrigação escolar- para gostar daquilo que o Manoel diz e coloca no papel- e sempre. Dizia ele ser um "vagabundo", viver de poesia. Ao herdar terras em seu Estado, ele pode se dedicar exclusivamente a esse oficio de "vidente", como classifica os poetas.
"Passei anos me procurando em lugar nenhuns, até que não me achei - e fui salvo" . Essa frase, parte de uma poesia, abre o filme, cujo título também é parte de uma poesia: "Só dez por cento é mentira". Mentira, verdade, invenção. Manoel de Barros diferencia muito bem, uma coisa da outra. Diz ele, mais ou menos assim no documentário: "se eu disser a você que fui a padaria, é uma mentira. Eu estou aqui. A invenção é outra coisa. Amplia o mundo".
E vai Manoel nos mostrando do que consiste a poesia:
O TEMPO SÓ ANDA DE IDA
A GENTE NASCE CRESCE AMADURECE ENVELHECE E MORRE.
PRA NÃO MORRER TEM QUE AMARRAR O TEMPO NO POSTE.
EIS A CIÊNCIA DA POESIA:
AMARRAR O TEMPO NO POSTE.
Pois então, esse documentário, na narrativa do diretor, foi realizado com muita insistência. Manoel de Barros não queria. E ali mesmo ele diz, tranquilo e amistoso: "pergunte o que quiser, se me interessar eu respondo". Chega uma hora, o sujeito não está mais ai para firulas. Não precisa mais agradar ninguém. No entanto, se reconhece amado. É uma lindeza de pessoa e um dos nossos maiores poetas.
Uma oportunidade para quem gosta de poesia e do Manoel de Barros, se deliciar com o trabalho. E para quem não tem tanta intimidade assim, ver como a utilização da linguagem pode ser rica, singular, abrir caminhos para a reflexão, desconstruir imagens rígidas, embelezar o mundo e como diz ele, amplia-lo.
Assista. Está na Netflix. E não sei quanto tempo vai ficar. Em geral esses filmes super especiais duram pouco nos streamings.
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