19 junho 2013

Na Ponte Aérea com um Presidente do Brasil.

  Sexta feira passada fui para o Rio de Janeiro, minha cidade. Cheguei meio atrasada ao aeroporto, mas meu voo havia sido cancelado. Portanto peguei o de meia hora mais tarde. E justamente por causa do tal cancelamento, eram as pessoas de dois voos esperando o próximo avião. Mudamos de portão algumas vezes, aquele estresse costumeiro de Congonhas. Fomos avisados, para o tumulto ficar ainda maior, de que não haveriam assentos numerados, mesmo que a reserva tivesse sido feita. Por ordem de chegada, as pessoas pegariam o lugar que quisessem. Ok.

Aglomeração, chilique. Muita furação de fila, mais do que o normal. Ao ponto de, na minha vez de passar pelo portão,  um senhor mais afoito vir de longe e pela lateral,  e com um "esbarrão" um pouco mais forte do que pediria a mínima educação, se colocar a minha frente, com uma urgência na voz, para descobrir  em seguida que,  aquele vôo  não iria para Curitiba, e sim o do balcão ao lado. Podia ter dormido sem a grosseria, vista por todos, até o último da fila. Mas a gente perdoa, o que é furar uma fila ali, na saída para- siiiim -  o ônibus- diante do descaramento de certos políticos brasileiros, por exemplo?

Pois bem, eu também não ia perder meu vôo por falta de lugar, de jeito nenhum. E fui uma das primeiras a entrar na aeronave- que nome mais futurístico. Sentei, sem nem pensar, na primeira fileira. E ao me abaixar, para não bater com a cabeça naquele finalzinho do compartimento de bagagens, quem  vejo? Fernando Henrique Cardoso, na fileira de trás. Que bom, um Presidente andando de ponte aérea, pensei. Ao mesmo tempo-... faz sentido, ele não está mais no cargo, não precisa de pompa e circunstância. Mas sim,  dar um bom exemplo como cidadão, sem pleitear maiores regalias, só por que o título é vitalício. Mesmo assim: ele não roubou, senão poderia ter seu próprio avião. Que coisa especial demais, um presidente que não roubou, não viveu em escândalos, não se meteu em corrupção. Chega a ser emocionante. Nossa moral está baixa não é? Sou grata a quem se comporta decentemente.

                                                                        FHC
Como se isso fosse extraordínário. E confesso, emprestei uma caneta do cidadão ao lado, e pedi um autógrafo. Coisa rápida, discreta e simpática. Acompanhada de bom dia presidente, grata presidente. E a parte discreta com relação a "tietagem" do võo do Fernando Henrique Cardoso termina aqui. 

Quando voltei a me sentar - e olha que sorte: pude ficar ali,  por que não apareceu nenhuma pessoa idosa, ou com bebê de colo, ou com outras necessidades especiais. Assentos prioritários, com frente mais espaçosa. Mas enfim,  no que sentei,  escutei um burburinho agoniado vindo da porta. Um passageiro  desconsolado não entendeu que os assentos não seriam marcados, e assim "esperou tranquilamente todas as pessoas entrarem por que tinha seu lugar garantido"(sic)

Adivinha qual o único assento estava sobrando? A janela, ao lado da companheira de viagem-ou de vida- do nosso Presidente Fernando Henrique Cardoso. Bem atrás da minha poltrona....

Vocês não imaginam o que foi aquela ponte aérea, depois que o cidadão se acomodou ali. Atravessar o Canal da Mancha a nado seria mais divertido, mesmo sem treinamento.  O sujeito perguntava,  gesticulava,  falava beeem alto, para todo mundo ver e ouvir que ele teve o privilégio de sentar-se ao lado de seu já camarada, o pre-si-den-te.


 Já tinha visto este tipo de histrionismo em salão de beleza: a tia do "affair" menos celebridade, de um famoso publicitário, que noivou e casou com algumas estrelas, contava a quem quisesse e a quem não quisesse ouvir, a vida íntima do criativo. Dando a entender que" mulher com ele era só para fachada". Um terror de fofoca, talvez caluniosa, e ainda envolvendo a própria parente. Só para dizer: olhem para mim, sou especial....esse ser humano...

  Mas especial mesmo, se "achando" e se "tendo certeza",  era naquele momento, o tal passageiro ao lado do Fernando Henrique e sua companheira de viagem: com que tom de "especialista" falou mal do governo Lula pra começar. Depois, Dilma.... O que um ex-presidente, um político,  poderia responder a um desconhecido, ainda mais dentro de uma avião lotado? "Hum.Rum"...um delicado rosnado.... Aí logo veio o assunto vôo cancelado, confusão de assentos. O Fernandão- amigo íntimo-  frisou que o dele estava na hora correta. Talvez querendo encerrar o assunto e  ler o jornal que farfalhava a sua frente...Mas o tal não dava trégua.  Qualquer coisa era motivo de júbilo: aeroportos do mundo inteiro - como o ilustre desconhecido era viajado, quase um aeromoço. O vexame dos nossos aviões, "maquinas precárias". Haja lanchinho para ocupar aquela boca.... Parque temático próximo ao aeroporto de algum país nesse mundão de Deus. Vai chover?Ou não vai?  Numa mistura de taxista e repentista- uma conversa emendando na outra, sem piedade.

 Até curiosos como eu,  interessada em prestar atenção na besteira, cansou. E passei a pensar que o homem sentado ali atrás, na poltrona do corredor,  transformou nosso dinheiro, que era quase simbólico, em algo Real. Alguém que trouxe uma aura de dignidade ao nosso país conhecido la fora pela famosa frase atribuída a De Gaulle, "Le Bresil n'est pas un pays serieux". Um presidente brasileiro que não precisava de tradutor. Falava vários idiomas, estudou na França, formou-se em Sociologia e Ciências Políticas, um intelectual que se preparou e não tinha vergonha disso, ao contrário. É o que se espera de um presidente: tenha conhecimento, dignidade, repertório.

Se não estou enganada foi no Governo Fernando Henrique que começou o primeiro projeto de  implantação da economia solidária, no nordeste. Uma ideia que veio da França, onde já se pratica a criação e uso de moedas paralelas, para incentivar a concentração de  recursos em regiões mais carentes, e dar crédito a pequenos investidores,  há mais de 30 anos. O Governo Lula deu continuidade a iniciativa, mas não foi seu criador.  Pouco importa essa  autoria, no fundo.
  O que quero dizer é que, ao ver um presidente que nos deixou um  bom legado, valeria a pena  beneficia-lo com nosso generoso silêncio. Ou talvez um sorriso. Quem sabe um muito obrigado. Mas a tagarelice é dispensável. Aliás,  em qualquer parte.
                                              Quando a gente não tem nada a dizer, compartilhar
                                                o silencio é bem melhor do a tagarelice..

  Em todo caso, se tivesse a oportunidade de sentar-me ao lado do Fernando Henrique, sem ter um chato já azucrinando, pediria um email para contato. Tenho uma amiga muito querida, Cientista Política, que está voltando da Universidade de Essex, onde trabalha para o Governo Inglês. Há mais de 15 anos atrás, sua tese de doutorado foi sobre a análise do discurso da campanha eleitoral que elegeu Fernando Henrique. Um primor de trabalho. Naquela época,  ela não conseguiu, mesmo com currículo tão importante, vaga em nenhuma universidade pública brasileira. Foi morar na Austrália desiludida com nosso país. E hoje a Pesquisadora Fátima Lampreia Carvalho, volta ao Brasil com muito mais ainda para compartilhar, do muito  que aprendeu la fora. Com pessoas tão importantes quanto ela, em termos de produção acadêmica e que as vezes endeusamos pelo simples fato de não serem brasileiros.
                                                               A Cientista Politica e
                                                                    Pesquisadora
                                                              Fátima Lampreia Carvalho
                                                                está vindo para o Brasil.
                                                             Aproveitemos essa cabeça,
                                                                  olhar e conhecimento.
                                                 
                                                             
Por que essa mania de que aqui todo mundo tem que ser colega, amigão do chopp da esquina, senão não serve, não gosta da gente, está esnobando? Muitas vezes as pessoas, conhecidas ou não, presidentes ou não, querem apenas ir de São Paulo ao Rio,  sossegados, para desligarem-se um pouco de tudo, e aproveitar o fim de semana. Isso é pecado?

Lembre-se disso passageiro desconhecido, e na próxima ponte aérea, seja lá quem você possa encontrar nesse céu de tantas estrelas, menos afetação: pega um livro, uma revista. A ansiedade vai ser bem menor. E você estará lá no fundo, e em silêncio, mais feliz com você.
                                          Meu fim de semana foi ótimo. Amigas queridas,
                                         passeios, peças, tudo de bom. Como contei aqui.
                                           


Fotos: criança em silencio, foto- Silêncio Site: SomosTodosUm.
Foto de FHC encontrada no Google em domingosmedrado.blogspot

6 comentários:

  1. eu admiro muito o fernando cardoso. aquele programa de entrevistas da maria cristina poli está para entrevistá-lo. até queria saber se já foi nesse domingo. beijos, pedrita

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  2. Ah legal esse programa ne Pedrita? Preciso assistir.
    Politico é sempre politico. Mas o FHC tem diversas qualidades que faltam aos outros sim. E essa coisa da ponte aerea foi mesmo engraçada, uma coisa diferente. Bjao

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  3. Oi, Cam!
    Sua amiga chega em uma boa hora ao Brasil! Precisamos de cientistas políticos que não sejam apartidários e que façam análises mais reais sobre o nosso atual momento.
    Ah, está arriscado você se encontrar com FHC mais vezes na ponte aérea. Ele vem todo fim de semana e fica em seu apartamento em São Conrado. Tenho amigos que sempre cruzam com ele pelas ruas do bairro - ele anda normalmente como qualquer cidadão - o que acho bastante arriscado por ser um ex-presidente.
    Tem uma moça muito sortuda que está namorando com ele!
    :)
    Beijus,

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    1. Ah deve ser a que estava com ele no avião, uma meio loura de cabelo curto, altona. Sei la se tão moça, o moço tem uns 80 anos não é? Mas parece muito jovial, aguentaria um novo mandato( sei nao).
      Fatima é exatamente isso, uma mega cientista politica. Espero que venha e possa fazer alguma coisa por aqui. Por que as vezes a pessoa quer e não tem nenhuma oportunidade. Como foi o caso, em pleno governo FHC...Acredito que ela nem tenha conseguido chegar perto...É o nosso país. cheio de secretários... Bjos

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  4. Mas quem disse que, para "roubar", a pessoa tem que ter avião particular para ostentar o "roubo"?! Desculpe-me, querida Camille, mas houve escândalos, sim (e muitos) no Governo FHC, tanto quanto (ou até mais do que) no Governo Lula ou Dilma: Pasta Rosa, Caso SIVAM, compra de votos para a reeleição, escândalos nas privatizações (só para citar alguns)... Por favor: simpatizar com a pessoa, vá lá, mas daí a pregá-lo de anjo... Vai aí um estirão!

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    1. Este comentário foi removido pelo autor.

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